domingo, abril 16, 2006

o banho





De um pote de barro

cai, tépido e continuo, um jorro de água

O corpo de mulher que o aceita

defende-se em contracção de pele franca e desnuda.

Gráceis, as pálpebras cerram-se.

As feições vincam-se em breves traços doridos

Juntam-se os seios em recolhimento

As longas pernas

querem guardar o segredo que as torna únicas.

O jorro continua

e a pose defensiva vai perdendo a lucidez.

Ciente da bondade da água

deixou de estar em guarda o feminil corpo.

Os olhos vão regressando à luz

As feições retornam à lassidão inicial.

Retornam os seios à pose hospitaleira

e as pernas vão deixando de se comprimir

como paredes inexpugnáveis.

Vai obliquando o pote, cada vez mais leve.

Embora mais pesado o sintam as mãos

que o sustentam.

A visão do corpo que se banha

toma a luz sóbria dos ritos perenes.

Calmo, completamente calmo.

Quente, completamente quente.

O corpo que sob a água se vai dissolvendo.

E o jorro cristalino continua

com o estoicismo próprio de quem deseja.

De novo descem as pálpebras:

desta feita com lentidões de langor e núpcias.

Os seios ganham firmeza de estátua realista.

Mostram agora, as pernas,

o mundo que até aí mantiveram cativo.

Esvairam-se as últimas gotas do pote de barro

Revigorados, os braços que o sustentavam pousam-no.

Do corpo que se banha erguem-se as mãos,

depois os braços.

A boca por último.

O banho terminou.

Mário Máximo

1 comentário:

Unknown disse...

Um banho quente entre(as)linhas...
Regressei.
daniel