terça-feira, junho 28, 2005


De Manhã...// Posted by Hello

Esta manhã...


Esta manhã em que o sol observa a terra
o poema nasce feliz e é devidamente adorado
Nasce o sol e nasce o poema
com esta simultaneidade
quer o poeta significar que a sua arte é luz
Esta manhã o poema nasce no ventre do papel
e nasce o sol no horizonte do papel

António Gancho

quinta-feira, junho 02, 2005

Em familia...

A mãe faz tricô

O filho faz a guerra
Ela acha isso naturalíssimo, a mãe.
E o pai?
O que é que faz o pai?
Faz negócios.
A mulher faz tricô
E o filho a guerra.
Ele, negócios.
Ele acha isso naturalíssimo, o pai.
E o Filho? E o Filho? E o Filho?
O que é que ele acha, o filho?
Não acha nada.

Absolutamemente nada.
O filho , o filho.
A mãe faz tricô
O pai, negócios
Ele a guerra.
Quando tiver feito a guerra
Fará negócios com o pai.
A guerra continua.
A mãe continua - faz tricô.
O pai continua - faz negócios.
O filho é morto.
Não continua mais .
O pai e mãe vão ao cemitério.
Acham isso naturalíssimo, o pai e a mãe
A vida continua.
A vida com o tricô, a guerra e os negócios,
os negócios, a guerra e o tricô.
os negócios, os negócios e os negócios.
A vida com o cemitério.

Jacques Prévert



Entre mãos... Posted by Hello

quarta-feira, junho 01, 2005

sem falar...

Pôs café
na xícara
Pôs leite
na xícara com café
Pôs açúcar
no café com leite
Com a colherzinha
mexeu
Bebeu o café com leite
E pôs a xícara no pires
Sem me falar
acendeu
um cigarro
Fez círculos
com a fumaça
Pôs as cinzas
no cinzeiro
Sem me falar
Sem me olhar
Levantou-se
Pôs
o chapéu na cabeça
Vestiu
a capa de chuva
porque chovia
E saiu
debaixo de chuva
Sem uma palavra
Sem me olhar
Quanto a mim pus
a cabeça entre as mãos
E chorei.



Jacques Prévert